domingo, 8 de abril de 2012

CRÔNICA: O Nazareno e o Santo - Fazenda Três Riachos

Paixão de Cristo na Fazenda Três Riachos - Foto: Edna Araújo
por Jair Eloi de Souza *

O canto da acauã se fez silente. A  tarde, imagino foi um braseiro, chuvas escassas e ausentes, forragens minguadas, a gadaria padecendo. A hora vesperal ainda assistira aos vôos tímidos das corujas noturnas  em piados compassados saindo de suas tocas, para viverem o mundo das trevas e consumirem mariposas desavisadas naqueles descampados dos sertões do Seridó. O cenário se fez diferente, era lua cheia, noviça se tornaria coadjuvante no espetáculo que estava a acontecer. Jesus, o Nazareno, fizera um pacto com o santo que nascera naquele lugar, João Maria. Tempos idos Logradouro, depois, Fazenda Três Riachos, que ganhara um templo para orações. Iniciativa de Elídio Queiroz, nativo aldeão, empreendedor e dotado de sentimento telúrico e de apego ao seu torrão natal, onde também viveram ali os seus ancestrais na decência da faina agropastoril e no fabrico de rapadura de banco, onde esse velho escriba sertanejo, ainda infante, raspara a gamela muitas vezes.

Tomei notícias fresquinhas, por Jarles Cavalcanti, a encenação do Cristo e as homenagens a João Maria, foram um sucesso. Inédito, raro, exuberante na riqueza de detalhes. Ganhara a tradição religiosa, a comunidade jardinense. Além da retribuição e gratidão ao filósofo da cristandade, o aldeão de Nazaré, da Judéia, da Galiléia, das bodas de Canaã, da defesa da samaritana, da falação no Sinédrio Galileu, da revitalização de Lázaro, o reconhecimento a obra humanista de Padre João Maria, dissertada nas oferendas e assistência aos pobres e doentes no seu tempo em Natal.     

O cênico do sofrimento de Cristo, na Fazenda Três Riachos, é um resgate à memória de um povo, absolve nossa geração que fez tão pouco por nossa Jardim de Piranhas. Creio ser uma oferenda da mais alta valia, quando se oportuniza aos mais velhos, uma visão ao vivo, de um centurião romano de forma involuntária produzindo o sacrifício de maior simbologia para a humanidade, num lugar tão simples, numa terra tão castigada, numa tenda onde muitos foram sacrificados pelas razias de épocas ruins.

Homenagear Cristo na forma de representação, é também estender as mãos aos mais desaquinhoados, é mostrar que o sofrimento também constrói um povo e sua história, mais resinoso na solidariedade, na harmonia, na sobrevida diante das grandes travessias e dificuldades. Faz a história diferente da que está proposta, pois, não exclui, não discrimina, não desanima, não perde o crédito e não constrange o ser humano.    

Minhas homenagens não só ao patrocinador, mas a todos que contribuíram nas suas limitações e apego para a realização do evento.

Lamentando não estar vivendo um abril chuvoso, com nimbos lacrimejando/2012..
É professor do Curso de Direito da UFRN.

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