por Jair
Eloi de Souza*
Nas
terras nordestinas, o outono trás para mata atlântica as nuvens prenhas,
carregadas e promovem na silhueta litorânea chuvas mansas, perenes,
molhadeiras. Nos sertões começa a estação da maturação das sementes, das
pastagens, dos grãos cultivados, é o início da estiagem, da seca. A gadaria vacum, esta de lombo encorpado,
consumira as gramíneas nativas, as ramas de mororó, camará, caatingueira, e
pronta para o abate. A miunça [1] de fêmeas prenhas, paridas,
pois, presume-se que houve uma rica estação de monta durante as águas de março,
o inverno nordestino. As aves de arribação se deleitam no consumo dessa riqueza
alimentar e botam-se a reprodução nos seus pombais espalhados em todas as
micro-regiões.
Mas,
a estação outonal é hospedeira do que acontece no verão no Nordeste brasileiro,
pois, é nesta estação que começa o inverno, a caída das primeiras chuvas, o
semear das sementes visando a produção grãos, cuja germinação depende das águas
de março, e do abril chuvoso para a colheita. E neste ano as águas de março e o
abril chuvoso, ficaram só na imaginação. A caatinga não borrifou, as lagoas
estão secas, os choradouros não lacrimejaram, as cacimbas estão de veias finas,
no fundão. Ano ruim, fome nos animais, morte lenta, pesarosa. Tristeza travosa
no sitiante. Noites estreladas em limpidez de amargura. Ausência da névoa
pós-chuvosa, meandrando os entornos das serras e do coaxar de sapos em
afogadilhos nas lagoas naturais.
O
caboclo sertanejo pergunta no silêncio da noite seca, tenebrosa, sinistra, voraz
na caloria, estafante, o que fazer de sua semente de gado. A estiagem é a mais
contextualizante dos últimos 50 anos, atingindo todos os quadrantes do
Nordeste. Não houve chuvas de mangas, os avulsos corredores de refrigérios nas
serrarias não existem. Um outono seco, estorricado, amedrontador aos viventes
de um mundo de sabedoria popular, mas desprotegidos das entidades reguladoras
das políticas que permeia num cenário em que a avidez de desvio de recursos é
uma máxima efetiva.
Por
oportuno se pergunta, os adivinhos falharam? Sim, os profetas de um mundo
telúrico, copiadores dos sinais do encantador cenário que oferta a mãe
natureza, podem ter feito uma leitura não correspondente a realidade vivida
hoje, outono/maio. Mas, e os cientistas, estudiosos específicos desse fenômeno
meteorologista, que puseram os olhos nas lunetas que desbravam a latitude,
longitude e a ocorrência desse fenômeno?. Que divulgaram regionalmente uma
previsão segura, e de certa forma ditaram condutas para os campesinos do
semi-árido com relação ao rebanho, a aquisição de um ou outro implemento
agrícola, o que fazer alguns, do seu estoque de grãos que guardaram com tanto
sacrifício.
Por
último, nesse pequeno estalo do meu dedilhar cronista, que dedico em todo o seu
lenho, ao homem do campo. Aquele do aboio reboado, do canto da toada no
traquejo do seu rebanho, aquele que nasceu ouvindo a sonoridade dos velhos
búzios dos seus ancestrais. Pergunta-se: e o Governo por si, ou através do
órgão competente, a Secretaria da Agricultura, caluda, letárgica, o que vai
fazer por esse mundão de desespero? E a categoria dos “nossos representantes”,
aquela que a mídia chama de políticos. Que todo dia, pintam nas colunas
sociais, não como agentes públicos fomentadores de projetos e políticas sociais,
mas, simplesmente como antílopes da vaidade? Que atitudes estão tomando? Até o
presente momento só vi um representante do Seridó se manifestar. Que pena o ato
de votar é mesmo um exercício de desvalia. A pretora-mor que já vinha
capengando no trato com o programa do leite, deve ter encontrado a velha acesa
para sepultar uma das melhores iniciativa dos últimos 20 anos, principalmente
no meu Seridó.
Recentemente
assisti uma matéria jornalística, que tinha no seu lenho, a entrevista com um
oficial da força nacional atrelado a defesa civil, enviado pela alcaide-mor
para sondar os efeitos da seca aqui no nosso RN. Confesso. Fiquei patético.
Antigamente quem tratava desse assunto era o Ministro do Interior, depois Integração
Nacional, agora é um espartano. Este pode ser um dos melhores oficiais. Mas,
neste momento, o Nordeste não está precisando de bivaque organizado, o que
estamos vendo, é uma tenda de miséria, os homens, mulheres, crianças, perdendo
os seus teréns, assediados pelas suas criações, urrando e berrando em fome e
sede.
Em
lua cheia e maio das noivas/2012.
*É
Advogado e professor do Curso de Direito da UFRN.
[1]
Miunça: criações de ovinos e caprinos nas terras nordestinas.
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