por Jair Eloi de Souza*
Na idade meã do Século XIX, seguindo o
exemplo dos paraibanos e cearenses, se instalavam os engenhos de bangüê nas
terras confins do Seridó. O estalar da quebradeira da cana de açúcar,
prenunciava o fabrico da rapadura de
banco. Por esses tempos, a mão de obra era suprida das tendas cativas, as
colônias latinas viviam a agudez do tráfico dos puxados na cor, vindos das
terras d`além mar sitas na mama África. É bem provável que o cultivar da cana
no Seridó, no contexto das terras massapesadas de baixio e nos brejinhos de
revência de açudes, tenha sido influenciado pelos cearenses. Pois estes
ocupavam com esta cultura o sopé da Serra do Araripe, no sul do Ceará, já que
na chã, havia o cultivo da mandioca para a farinhada e do próprio café.
De outra feita, a aquisição de rapadura e da
farinha no Cariri, embora ambas fossem de excelente qualidade, demandava custos
altos, ante a longa viagem no coice da burrarada, e ainda, riscos para os velhos matutos
comboieiros dos Sertões do Seridó, face a presença de salteadores a partir do
vale do Rio do Peixe e principalmente nas cercanias do entroncamento de todas
aqueles cidades da vizinhança do Crato,
como Barbalha, Missão Velha, Jardim e o próprio Juazeiro, que em razão das
pregações do Padre Cícero, transformou-se numa urbe, não só freqüentada por
fanáticos, mas, por cangaceiros, jagunços, gente de má índole, que se albergavam
nos feudos dos Coronéis, cuja truculência não guardava distância dos baianos e
alagoanos do último quartel do Século XIX e as primeiras décadas do Século XX.
Nos Sertões do Seridó, o fabrico de rapadura
de banco, tinha destinação para o consumo da própria região. Aliás, o doce, que era utilizado para todas as
serventias, era mesmo com exclusividade a rapadura, principalmente nos feudos
rurais. Coadjuvante no torramento do café, na confecção de doces, bolos. Não é
exagero afirmar-se que a rapadura era o alimento mais presente em todas as
formas e horas de refeição do sertanejo. No bisaco do caçador, no badaneco do
vaqueiro, no saco de boca amarrada do enxadeiro, na carona do viajante e
comboieiros, no bornal do cangaceiro, nos alforjes dos rastejadores ou matadores
de onça no sertão antigo, sempre havia um naco de rapadura para refeição
rápida.
No Município de Jardim de Piranhas e
adjacências, conheci ainda infante, alguns engenhos de moagens de cana: No Braz
o de Quinca Salvino; na Fazenda Três Riachos o do velho Manoel Ambrósio de
Queiroz; nos Pocinhos o de Vigolvino; no Góis o do velho Cição e ainda na
Saudade o engenho de Manoelzinho Cafunbó, este último já no Município de
Timbaúba dos Batistas e mais alguns que ouvia falar, e lamentavelmente não
cheguei a visitá-los.
Antes da floração das craibeiras amarelas,
na primavera setembrina, as velhas moendas começavam a produzir a garapa, que
se destinava aos grandes tachos e gamelas, no fabrico da rapadura e de batidas
temperadas. O engenho primitivo ou de bangüê, era movido a boi, um trabalho que
começava no quebrar da barra, A
estação das moagens tinha grande simbologia para o sertanejo, era um trabalho
coletivo, com funções especificadas, o permeio da garapa de tacho em tacho,
finalizando na gamela. Todos tinham um conhecimento pragmático do momento em
que a calda deveria passar para o tacho seguinte, no entanto a última palavra
era do mestre-da-rapadura, uma similaridade do mestre-de-açucar.nas usinas de
refino.
As velhas moendas do meu Sertão, foram
aposentadas, não se ouve mais o estalo do chicote no açoite da boiada, um
avanço. Porém, de conseqüência, não se encontra mais a qualidade nas rapaduras
ainda produzidas. Nas feiras livres, é comum se verificar o selo de terras
pernambucanas, produto com teor significativo de açúcar refinado. A produção do
Cariri perdera em qualidade. A brejeira de garajal está mais preta e salobra. O
homem destruiu a nobreza das terras massapesadas e de baixio em revência.
Que pena meu Sertão não era assim.
A lua ainda é minguante no mês das
cobras/2012.
É Professor de Direito e Escriba da cena de
uma civilização chamada Seridó.
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