segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

CONTO: RIAJ, O MENINO QUE SONHAVA COLHENDO ARAÇÁS

por Jair Eloi de Souza.*

A manhã era de uma brancura gelo. A névoa espraiava-se preguiçosa, deitava toda sua limpidez. Mansa, segura de que era realmente a moldura e cenário, de uma natureza pura nos seus mistérios, segredos, e alcovas que fazia questão de preservá-los. Sucedera uma madrugada fria, invernosa, onde o coaxar dos sapos em afogadilhos, sonorizava nos ouvidos de infantes, sons que vinham do além, sinistros, amedrontadores. Riaj, naquela manhã despertara cedo, como de sempre, pés descalços, enfrentava a frieza, uma gelidez de algumas horas de toró madrugadenho, pois, tinha que colher juás maturados, o seu primeiro refrigério, antes de começar suas obrigações matinais, que consistiam em alimentar pequenos cordeiros. Naqueles tempos, seus sonhos eram os mais pueris. Que o inverno fosse farto, que a lagarta fosse “fraca”, não devorasse a rama do algodão, que o Velho Iole, o seu ancestral mais querido, sempre estivesse com saúde, que fizesse do seu sonho imediato uma realidade. Mas que sonho?... Então, nada mais do que uma simples aquisição de tecido na loja para confecção de algumas peças para seu vestuário, pois, só contava com dois rústicos calções.

Porém, Riaj, tinha um outro sonho exótico e de queixumes. Talvez o mais ambicionado; era encontrar os campos abertos, onde pudesse colher araçás nativos. Naquela idade, nunca provara o sabor de uma goiaba. Os pomares que tinha visto até então, eram em quadros pintados em casa dos abastados do tempo. Só por isso o fascínio pelo araçá da caatinga, a goiaba nativa? Não!... Algo mais encorpava aquela história. Pois, fora numa manhã como outras manhãs de inverno, que vira uma certa cabrocha de cabelos mechados, olhos em negritude de quixaba madura, vendendo araçás em cesto de cipó trançado na Vila do Perfume. Riaj, não comprara os araçás, era menino, não usava bolso quanto mais pecúnias em troco. Assistira apenas a cena dos que compravam os araçás arredondados. Porém, não esquecera os olhos amendoados daquela cabrocha que nunca mais vira. Eis, a razão e o encanto, de continuar na puberdade dos tempos, sonhando a colher os araçás como se ainda fosse o infante das eras que se foram no dissipar do tempo.

A Lua Nova faz lacrimejar os nimbos, molhando a cinza carnavalesca, iniciando a liturgia da quaresma no meu Seridó/2012.

* É Professor e Dirigente do Curso de Direito da UFRN.                                     

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