domingo, 13 de maio de 2012

CRÔNICA: UM 13 DE MAIO NOS SERTÕES DO SERIDÓ: O PRETO LUIZ E A NEGRA JOSEFA

por JAIR ELOI DE SOUZA*

Em tempos vesperais a abolição do cativeiro, nas terras dos sertões do Seridó, a eloqüência de Joaquim Nabuco contaminava a opinião pública e granjeava a simpatia até dos mais abastados. De forma solene, em Serra Negra, onde o velho Espinharas faz curva e é indomável, segundo Juvenal Lamartine[1], fundara-se o Clube pró-abolição. Cabendo ao seu pai Clementino Monteiro Farias, a presidência da agremiação, a qual, os mais expressivos nomes do município se irmanaram para virar uma página da história que ofertava constrangimento aos povos civilizados.
Fato é, que aprazada a primeira reunião, para deliberar as condições de alforria aos puxados na cor, de logo, houve uma voz opositora à outorga da liberdade, bem como até de fazer parte do corpo coletivo. Tratava-se do Capitão Antônio Pereira Monteiro, cuja ancestralidade em linha direta, fora fundadora de Serra Negra. Tinha este uma gadaria que ultrapassava dez mil cabeças. Senhor do maior contingente de mão-de-obra escrava, e invocava serem os cativos parte do seu patrimônio, pois, foram adquiridos por compra ou herança.
Face ao comportamento inflexível do seu Senhor, para alcançar a liberdade, o Preto Luiz, pede guarida a Clementino Farias e a negra Josefa foi para a casa do prof. Antônio Carlos de Medeiros, que assumiram a condição de depositários dos cativos. O Capitão Antônio Pereira, judicializa o pleito de resgate dos escravos. Demonstra perante o Juiz Municipal por via de documentos, ser o Senhor proprietário destes, e é atendido. Expedida a portaria aos depositários, o negro foi entregue por Clementino Farias e Josefa que se valera do Major Sizenando Sátiro[2], fora arrebatada do oficial de justiça, e é custodiada por este e levada para sua fazenda no Município de Patos.
Em razão dessa atitude do Major Sizenando Sátiro, o Capitão Antônio Pereira Monteiro, impetra uma ação criminal contra aquele que é pronunciado. Aprazado o Júri, Sizenando comparece quatro dias antes, acompanhado de amigos, inclusive, do seu irmão Capitão Cazuza Sátiro, herói decantado pelos vates em função do ofício de grande matador de onças naqueles sertões, onde no sopé da Serra do Tronco, tinha morada e criatório de gado vacum,  com uma particularidade no seu curral de pau-a-pique, todo mourão era adereçado de uma carcaça de onça que tinha abatido. A absolvição foi unânime, sendo seguida de rojões de foguetões que se ouviam dos mais distantes rincões daquela jurisdição. Nesse dia teve jantar patrocinado pelos amigos do Major Sizenando Sátiro, e dentre as servidoras deste, estava a  mulata Josefa, que entrou para história como uma alforriada jurisprudencial nas terras do meu Seridó. O preto Luiz, após certo período de custódia em casa de um amigo de Clementino Monteiro Farias, no Município de Pombal, retorna a Serra Negra, para desgosto do Capitão Antônio Pereira Monteiro.
A irresignação do Capitão Antônio Pereira Monteiro, com petição recursal para anular o julgamento esbarrou na publicação da Lei do 13 de maio de l888, consolidando  pelo menos formalmente, a abolição do cativeiro, que  tornou-se uma evidência. Mas, no plano pragmático, ocorreram mudanças? É possível, não tanto quanto desejávamos. Pois, neste 13 de maio de 2012, decorridos 124 anos, a mulata Josefa, mesmo im memoriam,   não está entre as mães homenageadas, sua luta estava contida nos limites de defender sua liberdade, a recompensa dada a ela foi de servir liberta a mesa do jantar do seu protetor Sizenando Sátiro naquele tempo. Ela não teve o direito de cuidar dos seus filhos, era uma ama-sêca que embalava os filhos dos abastados dos tempos, cantarolando os cantos de seus ancestrais da Mama África, c`est la vie.
Parabéns Josefa, me honraria encontrá-la em paleio celeste com minha generosa Mãe – a guerreira Maria Elvira de Freitas, a fonte de minha vida e de ser um escriba das coisas do meu Sertão.
Em lua minguante/no mês das noivas/2012.

*É Professor e Dirigente do Curso de Direito da UFRN.


[1][1] Lamartine de farias, Juvenal, (Velhos costumes do meu Sertão)
[2] O Major Sizenando Sátiro era o avô do Deputado Ernani Sátiro.

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